Mariana Sanches - @mariana_sanches
- Da BBC News Brasil em Washington
Steve Bannon diz que as eleições de 2022 no Brasil são 'uma das mais intensas e dramáticas do século 21'
"Um enfrentamento, cabeça a cabeça, entre dois políticos carismáticos de estatura global."
Steve Bannon, o ideólogo da nova direita radical populista e estrategista principal do ex-presidente americano Donald Trump, define assim a eleição presidencial brasileira, que tem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à frente das sondagens de intenções de voto, seguido por Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição.
A eleição, que Bannon afirma ser a segundo mais importante do ano para o seu movimento de direita, também será, nas palavras dele, "uma das mais intensas e dramáticas eleições do século 21".
Aliado de Bolsonaro, a quem chama de "herói", Bannon não esconde o fascínio que tem por Lula. "Eu sou fascinado por Lula", diz, afirmando que estudou o petista por "muitos e muitos anos".
"Eu acredito muito nos trabalhadores. E parte do nosso trabalho tem sido atrair democratas e sindicalistas para a nossa causa. Então, tem coisas que Lula defende em que nós acreditamos", diz Bannon, que reconhece "o tremendo sucesso financeiro" da gestão do petista no Brasil no começo dos anos 2000.
Ele, no entanto, atribui a Lula proximidade que o próprio petista jamais ostentou com o Partido Comunista Chinês e sugere que, no poder, o ex-presidente faria do Brasil uma base para a China nas Américas, o que seria "uma questão para a segurança nacional dos EUA".
Considerado um mentor pela família Bolsonaro, Bannon afirma ser uma espécie de "posto de intercâmbio", promovendo a conexão direta entre os políticos brasileiros e expoentes da direita radical global como o húngaro Viktor Orbán, o italiano Matteo Salvini ou o próprio Trump.
De acordo com Bannon, essas conversas e conexões são centrais não apenas por questões ideológicas, mas para que cada grupo compartilhe com os demais experiências de campanha que possam potencializar suas chances de vitória em cada país.
Ele sugere, por exemplo, que Trump poderia ter economizado muito dinheiro na corrida presidencial de 2016 se tivesse aprendido como usar o Facebook como Bolsonaro usou na campanha em 2018.
Sobre a campanha atual, Bannon aposta que a figura da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, será capaz de unir o apoio dos evangélicos cristãos e impulsionar uma onda que empurre Bolsonaro com Lula para o segundo turno no próximo dia 2 de outubro.
Já em relação às Forças Armadas, ele diz ver menos apoio a Bolsonaro do que o próprio Trump teve no setor militar. Vale lembrar que o então presidente americano se viu barrado em diversos momentos de usar as Forças Armadas em seu projeto político.
Bannon defende que os militares brasileiros são "ator-chave" em um momento em que o presidente brasileiro faz alegações de fraude nas eleições brasileiras, sem provas. Mas descarta em território brasileiro algum cenário do tipo como a invasão do Capitólio 6 de janeiro deste ano, como até mesmo integrantes do governo americano têm alertado ser possível.
"O mundo exterior não deveria estar metendo o nariz nisso, seja o governo dos Estados Unidos, o pessoal de (fórum econômico de) Davos ou outros globalistas", afirma.
Bannon, porém, admite que o 6 de janeiro foi um erro para seu grupo político — porque os impediu de lançar mão de manobras legislativas que pudessem, de acordo com sua perspectiva, contestar o pleito que elegeu Joe Biden a ponto de forçar nova votação.
Assim como três quartos dos republicanos, ele segue repetindo que Biden não é um presidente legítimo. Ele é investigado por seu papel na invasão — que ele diz ter sido nenhum — e também enfrenta um processo por ter se recusado a depor diante do Congresso sobre o assunto.
A despeito disso, diz que tanto o trumpismo quanto o bolsonarismo são movimentos democráticos. E reconhece que podem não triunfar nas urnas sempre.
"Você não vai ganhar todas as eleições. E quando você ganha, pode não estar no poder para sempre, mas faz parte de um processo. Se você olhar para o fluxo desde a crise financeira de 2008, não há absolutamente nenhuma dúvida de que a direita nacionalista populista não é apenas ascendente, que nós ganhamos muito mais do que perdemos, e fizemos algumas mudanças bastante significativas, seja (com) Trump nos Estados Unidos, (com) Brexit (no Reino Unido) e Bolsonaro no Brasil", afirma Bannon.
Na Justiça americana, Bannon enfrenta também uma acusação de ter enriquecido ilicitamente desviando recursos de doação de trumpistas para a construção do muro na fronteira com o México, uma promessa de campanha do ex-presidente. O caso já o levou, inclusive, a ser preso. Bannon nega qualquer crime.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista — editada por concisão e clareza — que Bannon concedeu à BBC News Brasil via zoom, diretamente do estúdio onde grava seu programa político, o War Room.
BBC News Brasil - No ano passado, o senhor disse que a eleição brasileira é a segunda mais importante de 2022, atrás apenas das eleições legislativas de meio de mandato nos Estados Unidos, em novembro. Por quê?
Steve Bannon - Vamos voltar a 2016. O Brexit, que aconteceu em junho, e a vitória de Trump (na eleição presidencial americana em novembro daquele ano) estavam intrinsecamente ligados. Essas coisas tendem a se mover em ciclos, e a inspiração e as questões que surgiram no Reino Unido com o (partido de direita radical britânico) Ukip e o Brexit foram algumas das coisas sobre as quais estávamos discutindo nos Estados Unidos, basicamente soberania, fronteiras, imigração.
A mesma coisa se repete agora. Nós tivemos a vitória dos Democratas Suecos (partido de direita radical que saiu vencedor nas últimas eleições e comporá pela primeira vez o governo do país). Você tem Giorgia Meloni (de um partido pós-fascista e favorita a ser a primeira ministra da Itália), a quem conhecemos e com quem trabalhamos há anos, e com ela está surgindo na Itália e no sul da Europa uma coalizão de direita.
Mas o mais importante sempre foi o Brasil. E digo isso porque o pleito brasileiro é muito próximo da eleição americana de meio de mandato (em novembro), e as questões (discutidas nos dois processos) são mais ou menos as mesmas.
Steve Bannon é um aliado do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (PL)
Bolsonaro é um grande herói para todos nós. Ele está no nível de Viktor Orbán (na Hungria) como alguém que defendeu a soberania nacional e realmente construiu uma base. Ele tem evangélicos, ele tem pessoas da classe trabalhadora. Se você olhar para o Brasil, (o bolsonarismo) é muito parecido com o movimento Maga (Make America Great Again, de republicanos ligados ao Trump), os bolsonaristas são muito parecidos com os desvalidos do America First, o que chamamos de hobbits do condado (metáfora de Bannon para aludir à vida de anseios simples dos trumpistas).
Isso é o que você vê em Bolsonaro. E as pessoas alinhadas contra ele, particularmente os globalistas, são as mesmas (que estão contra Trump). E mais especificamente por causa dessa corrida eleitoral, a associação de Lula com o Partido Comunista Chinês, principalmente no que se refere a commodities e recursos naturais, fazem desta, eu acho, uma das eleições mais importantes, não apenas deste ciclo (eleitoral), mas nos últimos tempos.
BBC News Brasil - O senhor está dizendo que o Lula tem uma relação especial com a China, mas no ano passado, sob Bolsonaro, o Brasil foi o país no qual a China mais investiu no mundo. Como isso cabe no seu argumento?
Bannon - Obviamente, o Brasil é um país de recursos naturais com um grande negócio de exportação. O Partido Comunista Chinês precisa desses recursos. Mas eles foram comprados no mercado livre. Isso é bem diferente da relação de Lula com a China.
Lula foi várias vezes a Pequim. Lula tem uma visão de mundo comum à do Partido Comunista Chinês. E o sucesso econômico (do governo Lula) está diretamente ligado aos negócios de exportação e commodities do Partido Comunista Chinês, que essencialmente olha para o Brasil como quase uma espécie de colônia para eles, principalmente em recursos naturais.
Lula vai trazer tudo isso de volta. E os chineses veem o Brasil mais do que nunca como um necessário parceiro de commodities. Então, a relação entre Bolsonaro e o Partido Comunista Chinês é mais comercial. Com Lula é muito diferente. Ele dará uma grande base para o Partido Comunista Chinês na América Latina e isso se tornará uma importante questão de segurança nacional para os Estados Unidos.
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